O Impacto da Energia nas Comunidades Ribeirinhas da Amazônia

 

Comunidade ribeirinha na Amazônia
Comunidade ribeirinha na ResEx Médio Purus, Amazonas.

O Cenário Energético do Brasil

De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio do IBGE, em 2019, 99,8% da população brasileira tinham acesso à energia elétrica. Porém, o cenário energético do Brasil é bem mais complexo do que essa porcentagem dá a entender. Ainda existe uma série de desafios para a melhoria do setor, entre os quais: a universalização do acesso à energia, a adequação de soluções que atendam às realidades diferentes nas diversas regiões, a infraestrutura precária das periferias, a grande dependência em hidrelétricas (suscetíveis às mudanças climáticas e aos diversos padrões pluviais), o grande índice de perda de energia, a falta de soluções que permitam a produção de energia perto dos pontos de consumo e a iniquidade no custo da tarifa elétrica.

Além disso, a maior parte da população sem acesso à energia se concentra em domicílios com renda familiar abaixo de 2 salários mínimos, 80% dos quais estão em áreas rurais predominantemente no Norte, Nordeste e Centro-Oeste do país. Isso se deve a três fatores principais: ao poder aquisitivo reduzido dessas pessoas, à baixa densidade geográfica das comunidades e, sobretudo no Norte, às características geográficas, que, aliadas aos dois fatores anteriores, dificultam a logística e a instalação de redes de transmissão e distribuição.

As Iniciativas de Eletrificação

A região amazônica é a mais crítica no que tange a falta de acesso à energia, portanto, nela se concentram diversos projetos que buscam resolver essa questão. Dentre eles está o das ResEx (Reservas Extrativistas) Produtoras de Energia Limpa, desenvolvido pelo WWF-Brasil e pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), em uma parceria que se propõe a proteger e expandir as unidades de conservação no Brasil.

O objetivo do mesmo é demonstrar a importância do fornecimento de fontes de energia sustentáveis (neste caso, a energia fotovoltaica) para as comunidades tradicionais, que residem nas ResEx e em outras áreas de conservação. Pretende-se melhorar a qualidade de vida dos habitantes dessas regiões, por meio do aperfeiçoamento de seus processos produtivos e sistemas de saúde, educação e lazer. Ambas as organizações mencionadas se propuseram a comprovar a relevância da luz por meio de um projeto-piloto nas comunidades das ResEx Ituxí e Médio Purus, situadas no município de Lábrea, no sul do Amazonas.

“Hoje, grande parte dos ribeirinhos que moram nas ResEx, por exemplo, paga caro para ter uma média de três horas de energia por dia”, comenta a analista de conservação do WWF Brasil, Alessandra Mathyas. Essa energia vem de motores movidos a diesel e gasolina. Nessas localidades remotas, o litro do diesel custa, em média, 5 reais, podendo ultrapassar 7 reais. Cada comunidade paga em torno de 600 reais por mês para contar com poucas horas de energia à noite e poder ter atividades de lazer, trabalho e estudo, tais como assistir à televisão, produzir artigos artesanais e ter aulas no horário noturno.

A maioria dessas populações precisa recorrer a subsídios governamentais e recebe meio salário mínimo em média, basicamente o valor da conta de energia usada ao longo do mês. Para complementar as fontes de renda, elas se dedicam às seguintes atividades: agricultura familiar, extrativismo e pesca, bem como à produção artesanal de produtos, utilizando a madeira como matéria-prima. Por causa da falta de energia, o contato com o mercado é mínimo, ocorrendo apenas durante as vendas locais ou com os atravessadores (comerciantes que vendem produtos diversos através de barcos).

A Energia Proporciona Qualidade de Vida

De acordo com Alessandra Mathyas, “este é o grande desafio: com energia 24 horas por dia, os ribeirinhos poderiam melhorar a qualidade de seus produtos e, assim, ter acesso a mais mercados. Seria possível montar, por exemplo, pontos de refrigeração no rio, para o armazenamento do peixe (hoje eles ficam horas de barco para ir até a cidade comprar gelo); seria possível começar a coletar outras frutas, que hoje não são comercializadas por serem muito perecíveis e seria possível abrir usinas de beneficiamento de frutas.”

Com energia na comunidade, vários problemas de saúde, tais como pressão alta e diabetes, poderiam ser evitados, uma vez que os alimentos são conservados por meio do uso de sal ou açúcar. Além disso, essa população poderia contar com o abastecimento de água através de bombeamento, o que, por um lado, evitaria o esforço excessivo em atividades cotidianas como lavar louça e, por  outro, permitiria o tratamento de água para consumo. Essa melhoria na qualidade de vida vem sendo comprovada pelos 16 sistemas de bombeamento solar instalados pelo WWF-Brasil e pelo ICMBio nas Resex Médio Purus e Ituxi.

Outro detalhe importante é que a energização das escolas presentes nas comunidades (são 80 na ResEx Médio Purus, por exemplo) traria mudanças impactantes. “Hoje, nas escolas onde funciona o Ensino Médio que tem internet, os alunos só conseguem acessá-la com o professor, durante o horário da aula e só para a finalidade da aula. Não tem como os alunos fazerem pesquisa fora desse horário, porque não tem energia. Se em um ambiente desses houvesse energia, daria para fazer várias outras coisas, como ter um laboratório de informática, fazer pesquisa e fazer faculdade à distância. Mudaria a vida das pessoas!” ressalta José Maria Ferreira de Oliveira (Zé Maria), gestor do ICMBio.

Escola ribeirinha iluminada com energia solar.

As poucas horas de energia com as quais algumas escolas contam para as aulas noturnas são subsidiadas atualmente pelo Governo estadual (Ensino Médio) e pela Prefeitura (Ensino Fundamental). Uma das comunidades, que teve uma escola eletrificada com um sistema fotovoltaico instalado pelo WWF-Brasil e pelo ICMBio, pôde economizar mais de 3 mil reais em combustível em um ano, dinheiro que o governo conseguiu destinar a outras comunidades desprovidas.

As Lições Aprendidas

Fica claro que, para que haja um impacto significativo na redução da falta de acesso à energia, faz-se necessária a participação de diversos agentes, como o setor privado, os órgãos públicos e o terceiro setor. “Esses projetos-modelo […] devem alavancar o aprendizado e as iniciativas mais amplas para informar políticas públicas e apoiar soluções de infraestrutura de baixo impacto na floresta”, ressalta Traci  Romine, da Fundação Mott, principal financiadora do projeto.

Tais iniciativas devem incluir a estruturação de novos mercados e as conexões com empresas que proporcionem a independência econômica das comunidades. Para tanto, é preciso aumentar as pesquisas, as coletas de dados e os estudos de casos de sucesso, bem como aprofundar as discussões sobre o tema de forma coletiva, para que se possam estabelecer planos concretos para a superação desses obstáculos e garantir o desenvolvimento sustentável das populações amazônicas e outras populações isoladas no Brasil. Um desenvolvimento sustentável que conduza à independência econômica dessas comunidades, de forma inovadora, e que permita o investimento local na qualidade de vida, favorecendo ainda mais o relacionamento harmônico com os sistemas naturais ao entorno.

O Programa de Acesso à Energia da Schneider Electric

A Schneider Electric criou seu Programa (Global) de Acesso à Energia em 2009 e continua investindo no crescimento da área para impulsionar soluções inovadoras para os obstáculos que dificultam a universalização do acesso à energia. O programa se centra em dois pilares estratégicos na América do Sul:

  1. No investimento em parcerias para o apoio da educação técnica e do empreendedorismo na área da energia;
  2. No desenvolvimento de um negócio social e inclusivo que comercializa produtos de energia solar de alta qualidade.

Ambos os pilares se complementam para ajudar a criar uma cadeia de valor de energia nas regiões mais necessitadas.

Em 2018, a Schneider Electric participou do projeto ResEx Produtoras de Energia Limpa por meio da venda subsidiada de componentes, como inversores solares, controladores de carga e dispositivos de proteção elétrica, para uma das escolas na ResEx Médio Purus. Posteriormente, ela foi convidada a fazer uma viagem à região, para que visse de perto a realidade difícil das comunidades sem acesso à eletricidade. Em novembro de 2021, a Schneider participou de outra missão, desta vez com a ONG Universidade do Amor, a fim de distribuir 54 lanternas solares Mobiya Original, doadas pelo Instituto Schneider Electric na Comunidade, para comunidades ribeirinhas e indígenas situadas à margem do Rio Negro, no Amazonas. Foi uma ação não apenas filantrópica, como também de pesquisa, para avaliar como a empresa pode apoiar de maneira mais efetiva os esforços de universalização do acesso à energia na região.

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