Olhando as INDCs dos países que assinaram o acordo de Paris na COP21, vemos que os compromissos são diferentes e variados. Todos de alguma forma afetam o impacto do homem sobre o clima, mas não é tão simples quantificar esse impacto, e muito menos a contribuição de cada país. Para entender melhor os vários cenários para se alcançar a tão sonhada redução das emissões de CO2, vou apresentar aqui a equação de Kaya (“Kaya Identity”).
Yoichi Kaya e uma equipe de engenheiros especialistas da Tokyo University escreveram a equação abaixo, para projetar o crescimento das emissões de CO2 produzido pelo homem, e seu impacto no meio-ambiente. Trata-se de uma fórmula simples que usa índices comuns do nosso dia-a-dia (aqueles que o William Bonner menciona no JN diariamente).
Veja a equação de Kaya e algumas premissas básicas:
Como a geração de energia é o que mais impacta as emissões, a fórmula deixa de lado impactos pontuais ou regionais como queimadas ou desmatamento. Esta premissa é válida, pois quando pensamos nas emissões de CO2 no planeta como um todo, o que importa mesmo é a geração e uso de energia. Ao decompor o impacto das quatro variáveis acima, Kaya nos permite projetar cenários de forma simples. Eu até fiz isso em uma planilha Excel, que você pode baixar aqui.
A primeira variável é a população. Mais gente exige mais geração de energia, mais produção de alimentos, e mais consumo de recursos em geral. A população da Terra é de 7 bilhões atualmente, e atingirá 9 bilhões de pessoas no meio do século. Esse crescimento, da ordem de 0,9% ao ano, exercerá grande pressão sobre o meio-ambiente.
A segunda variável é a renda per capita (produção de riqueza por habitante), que normalmente é ligada ao padrão de vida das pessoas, e que cresce mais de 2% ao ano (média mundial). Um cidadão americano consome muito mais do que um africano, por exemplo. E obviamente, trazer todos a um padrão de vida americano ou europeu significaria um volume gigante de CO2 na atmosfera. Esta variável é estratégica para países pobres ou em desenvolvimento, que querem ter o direito de “enriquecer” a sua população, o que significa aumentar emissões. Dos países da América do Sul, Argentina, Colômbia e Peru manifestaram isso em suas INDCs.
A terceira variável é a intensidade energética, ou seja, quando a sociedade precisa de energia para produzir riqueza. A chave aqui é usar menos energia, ser mais eficiente. Vários países declararam que incentivarão ações de eficiência energética, dentre eles Brasil, Argentina e Colômbia. Mas esta variável deve considerar também as mudanças de nossa economia, em clara transição para um formato mais “digital”. Há cenários em que a intensidade energética cairá até 2,8% ao ano até 2040.
E a última variável, é a intensidade de carbono na matriz energética. Obviamente, quem quiser melhorar essa variável terá de aumentar o uso de energias renováveis e diminuir o uso de combustíveis fósseis. Não há outras formas de diminuir a intensidade de carbono. A California decidiu que estará livre de carbono até 2050. Mas isso não acontecerá em toda parte. As previsões mais otimistas falam em redução da intensidade de carbono a uma taxa de 2,3% ao ano.
A China, se comprometeu a reduzir em 60% a intensidade de carbono na sua economia (que é o resultado do produto das variáveis 3 e 4). Mas é importante esclarecer que, se as demais variáveis não foram gerenciadas, é possível que as emissões chinesas aumentem assim mesmo. Como a China, o Chile prometeu reduzir 30% as emissões por unidade do PIB. Mas estabeleceu condições mínimas de crescimento econômico para este compromisso.
Outros países, como EUA, Europa e Brasil, se comprometeram a reduzir as emissões totais (que é o que importa) e não apenas algumas variáveis da equação. Os EUA se comprometeu em reduzir 26% suas emissões até 2025 (abaixo dos níveis de 2005). O Brasil prometeu reduzir 37%, com grande parte vindo da promessa de acabar com o desmatamento ilegal. Mas a maior contribuição virá mesmo da Europa, que prometeu reduzir 40% suas emissões em comparação com valores de 1990.
Como um todo, o mundo precisa alcançar o Cenário 450 da Agência Internacional de Energia, que estabelece 450 ppm como a concentração máxima de CO2 na atmosfera para limitarmos o aquecimento global em 2o Celsius. Olhando a equação, parece claro que se queremos zerar as emissões, temos que zerar pelo menos uma das variáveis. Mas não vamos eliminar a população da Terra, nem parar de comer ou de ir trabalhar.
Com isso, nos restam apenas as duas últimas variáveis. E portanto dois caminhos: eficiência energética e energias renováveis. Temos que gastar menos energia. E temos que produzir energia de forma mais limpa. E pelas projeções que você mesmo poderá fazer (baixando a planilha de simulação), é bom começarmos já.
Conversa
renata
7 anos ago
Muito interessante esse site. Parabéns pelo trabalho