Emissões de Alcance 1, 2 e 3: o que são e como geri-las?

Autor: Meritxell Arus – Global Marketing Leader Iberia

O Alcance das emissões de carbono é o protocolo mais generalizado para medir e classificar as emissões produzidas pelas organizações, dividindo-as em emissões diretas e indiretas e classificando-as, por sua vez, nas categorias de emissões de Alcance 1 (todas as emissões diretas); emissões de Alcance 2 (emissões indiretas que provêm da compra de eletricidade, calor, vapor, etc.); e emissões de Alcance 3 (as restantes emissões indiretas, tanto a montante – pelos fornecedores – como a jusante – pelos consumidores). Em Portugal, ainda não é obrigatório que as empresas reportem a sua pegada de carbono; no entanto, já vemos outros países, como por exemplo a vizinha Espanha, a promulgar leis nesse sentido. Assim, é expectável que caminhemos também para o mesmo destino. De olhos postos no futuro, neste artigo vamos analisar mais de perto o conceito de pegada de carbono, bem como os diferentes Alcances e algumas das medidas que as empresas podem adotar para a reduzir.

O que são os Alcances das emissões? Definição, origem e ferramentas de cálculo

A norma corporativa do Protocolo de Gases com Efeito de Estufa (GEE), que define os Alcances, foi desenvolvida conjuntamente pelo World Resources Institute (WRI) e pelo Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável (WBCSD) e é a ferramenta mais comum para a contabilização global das emissões de gases com efeito de estufa produzidas pelas organizações. As emissões coletivas de uma empresa, também conhecidas como a sua pegada de carbono, são determinadas pela aplicação de diversos multiplicadores baseados nos potenciais de aquecimento global dos GEE às atividades de emissão da organização.

Emissões de Alcance 1, 2 e 3

O Protocolo de Gases com Efeito de Estufa identifica as atividades de uma organização que produzem emissões como diretas ou indiretas. As emissões diretas provêm de fontes detidas ou controladas pela empresa ou organização, como a sua sede ou fábrica. As emissões indiretas são as que resultam da atividade da empresa, mas que não são por ela detidas ou controladas diretamente; por exemplo, as emissões de uma companhia aérea que os seus colaboradores utilizam para viajar, as emissões geradas na produção do aço que é depois utilizado nos seus produtos, ou as emissões que vão ser geradas no futuro pelos automóveis que a empresa fabricou.

Tal como dissemos acima, o Protocolo classifica ainda as emissões diretas e indiretas em três Alcances diferentes. Vamos olhar em pormenor em cada um deles.

Emissões de Alcance 1

O Alcance 1 abrange todas as emissões diretas resultantes das operações de uma empresa. Inclui todas as emissões que estão sob o seu controlo, como a utilização de combustíveis fósseis na própria empresa, a sua frota de veículos, os equipamentos de processamento interno, etc.

Sendo detido e passível de controlar pelas próprias empresas, o Alcance 1 é um dos primeiros pontos em que se devem focar quando iniciam o seu processo de descarbonização. A eficiência e a otimização dos processos é uma primeira quick win para reduzir as emissões do lado da procura. Por exemplo, a substituição de equipamentos por outros mais eficientes ou a instalação de um BMS para monitorizar e melhorar a eficiência das operações ajudará a reduzir as emissões de Alcance 1. No caso das indústrias, a combinação certa de sensores inteligentes, dispositivos conectados e controlos avançados de processos pode permitir poupar até 30% de energia, de acordo com a Agência Internacional da Energia (AIE).

Outra medida a implementar para reduzir as emissões de Alcance 1 é a substituição de combustíveis altamente poluentes. Por exemplo, o carvão emite 90.7kg de dióxido de carbono por milhão de BTU[i], enquanto o gás natural emite apenas 53kg – e este valor é ainda mais reduzido no caso dos biocombustíveis.

Os benefícios da digitalização aumentam quando esta é combinada com a eletrificação. A eletrificação substitui os combustíveis fósseis, mas também nos permite um maior controlo e precisão. Além disso, hoje em dia a eletricidade é mais rentável e está mais disponível, especialmente na indústria ligeira. Embora esta indústria tenha uma pegada energética menor do que a sua congénere mais pesada, também pode beneficiar mais da eletrificação. De facto, um estudo recente da AIE estima que a eletrificação tem a capacidade de proporcionar 70% do potencial total de poupança de energia no setor.

No caso das emissões de Alcance 1 que não podemos eliminar, existem mecanismos para as compensar, investindo em projetos que reduzam ou absorvam essas emissões. Alguns dos mecanismos de compensação mais comuns são projetos de captura de gás de aterros, silvicultura ou projetos que substituam combustíveis por alternativas menos intensivas em carbono.

Emissões de Alcance 2

O Alcance 2 inclui todas as emissões indiretas de gases com efeito de estufa resultantes da compra e consumo de eletricidade, calor, vapor ou refrigeração.

Estas emissões são fisicamente geradas por um terceiro, que é responsável pela produção, que será depois transportada e consumida por um utilizador final – sendo, portanto, atribuída a esse utilizador. O consumo indireto de energia adquirida é separado de outras emissões indiretas porque representa frequentemente uma parte considerável da pegada de carbono de uma empresa.

Embora indiretas, as emissões de Alcance 2 podem ser facilmente controladas pelas empresas que optam por um consumo 100% renovável. Podem utilizar uma combinação de certificados de atributo de energia (EAC), produção de renováveis no local e microgrids, contratos de aquisição de energia (PPA), tarifas verdes e até compensações de carbono.

Nos últimos anos, temos visto como várias empresas estão a acelerar a descarbonização do seu Alcance 2 com a adoção de compromissos ambiciosos no que toca ao consumo de energias renováveis. A iniciativa RE100 é um bom exemplo: mais de 300 empresas, incluindo Apple, Google, Walmart, IKEA e também a Schneider Electric, comprometeram-se a tornar todo o seu consumo de eletricidade 100% renovável. Em Portugal, a RE100 inclui empresas como a LG, os afiliados do Hyundai Motor Group e a Acer.

Emissões de Alcance 3

As emissões de Alcance 3 compreendem as restantes emissões indiretas, tanto as que são geradas a montante para permitir que a empresa desenvolva as suas operações, como as que são geradas a jusante, a partir da utilização e reciclagem das suas operações. Embora sejam o resultado das operações da empresa, provêm de fontes que não são detidas ou controladas por ela. Alguns exemplos são as emissões geradas pelos fornecedores, as deslocações e viagens de negócios dos colaboradores ou a eliminação de resíduos. Na maioria dos casos, especialmente no ambiente industrial, o Alcance 3 é onde se acumula uma grande parte das emissões.

Como se podem reduzir as emissões de Alcance 3? Desde a substituição de viagens de negócios por reuniões virtuais à redução do consumo de materiais, dando também prioridade aos que têm a menor pegada ambiental e favorecendo os fornecedores que também estão a trabalhar para reduzir a sua própria pegada de carbono. A jusante, é necessário considerar a conceção dos próprios produtos e serviços, bem como a sua reciclagem e fim de vida, para minimizar as emissões.

O Alcance 3 é particularmente relevante, não só devido ao seu peso na pegada de carbono, mas, como já referimos, também porque pode haver desenvolvimentos legislativos que levem à obrigatoriedade de as empresas comunicarem as suas emissões de Alcance 3.

[i] BTU – British Thermal Unit (unidade térmica britânica), uma medida frequentemente utilizada para medir a quantidade de energia térmica libertada ou transferida em processos de aquecimento, arrefecimento ou produção de energia.

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