por Regina Magalhães e Tarcila Ursini
A 4ª revolução industrial não se limita a economias mais avançadas e a setores específicos – trata-se de um fenômeno global que afeta todas as atividades econômicas. Tampouco se limita a mudanças tecnológicas, implica em transformações institucionais, sociais, comportamentais, de propósito e de consciência, que irão transformar nossas vidas e o futuro de nossas empresas – dimensões que estão cada vez mais interconectadas.
Foi nesta linha de raciocínio que Larry Fink, CEO e fundador do BlackRock, considerado o maior gestor de ativos do mundo, escreveu sua conhecida “Carta anual aos CEOs” de 2018 – “… para prosperar no longo prazo, as empresas devem não só gerar rentabilidade financeira, mas também demonstrar como contribuem de forma positiva para a sociedade”. E destaca o necessário papel de uma governança mais ativa, comprometida e diversa para melhor identificar riscos e oportunidades que fomentem o crescimento a longo prazo. Dito de outra forma: a BlackRock dá um importante passo na introdução de critérios ASG (ambientais, sociais e de governança) no seu já tradicional ativismo.
Neste contexto, a composição atual e a maneira como conduzimos a governança em nossas organizações endereça os novos desafios e oportunidades da sociedade e dos investidores de hoje e do futuro?
4a Revolução industrial e o valor compartilhado
As novas tecnologias como a inteligência artificial, internet das coisas, blockchain, automação e biotecnologias podem reduzir custos de alimentos, tratamentos de saúde, moradia, ampliar o acesso à educação de qualidade e gerar novos negócios. Enfim, elas têm o potencial de promover aumento de bem-estar social e de sustentabilidade ambiental, atingindo gigantescos mercados antes não atendidos ou operando de forma ineficiente.
Por outro lado, as mesmas tecnologias podem agravar antigos problemas sociais e ainda gerar novos desafios para a humanidade, como por exemplo, o desemprego tecnológico, as desigualdades, a formação de grandes monopólios globais, o fim da privacidade, a quebra dos laços sociais, o isolamento das pessoas e a polarização política. São problemas complexos que já estamos vivenciando e são o resultado da convivência de tecnologias do século XXI com instituições do século XX.
Com base neste contexto que a Singularity University com sede no Vale do Silício, e Peter Diamandis , um de seus fundadores, foca seu campo principal de atuação, acreditando que as maiores oportunidades de negócio estarão nos maiores problemas da humanidade, capacitando as pessoas para criar um futuro abundante por meio da aplicação de tecnologias exponenciais.
Ou seja, tecnologias não são capazes de promover mudanças positivas na sociedade se não estiverem integradas a modelos de negócios que visem objetivamente a solução de problemas sociais reais. E a modernização da governança das empresas é uma das condições mais importantes para que as tecnologias proporcionem desenvolvimento humano e ambiental, e prometem ser um bom negócio.
Isso já está presente nas estratégias de grandes multinacionais e em novas empresas. No topo da Change the World List de 2018, o J.P. Morgan Chase está investindo 250 milhões de dólares em pequenos negócios para revitalizar a cidade de Detroit. A EFL , vencedora em 2017 do prêmio da MIT Inclusive Innovation Initiative, é a primeira empresa a utilizar psicometria para análise de risco de crédito de pessoas de baixa renda e planeja com isso incluir 1 bilhão de pessoas no mercado de crédito.
Mas também no Brasil muitas empresas estão criando negócios lucrativos desenhados especialmente para gerar benefícios sociais e ambientais. A Duratex desenvolveu um novo propósito que direciona o seu modelo de negócio para criar soluções inovadoras que melhorem a qualidade de vida das pessoas em seus lares e locais de trabalho, já refletido nas novas aquisições em 2017. A Fibria desenvolve tecnologias para a produção de polímeros sofisticados para usos em diversas indústrias a partir de matéria prima renovável. A Braskem tornou-se o maior produtor mundial de polímeros oriundos de fontes renováveis, o etanol de cana-de-açúcar.
A HP junto com uma das suas principais fornecedoras, a Flex, desenvolveu uma das indústrias de reciclagem de eletrônicos mais sofisticadas do mundo, a Synctronics, com sede no Estado de São Paulo. A Coca Cola anunciou em janeiro de 2018 o investimento bilionário na reciclagem de embalagens plásticas.
A Unilever e a Danone estão desenvolvendo alimentos produzidos de forma sustentável e que buscam melhorar a nutrição. A Native, a Korin e a Mãe Terra (esta última recentemente adquirida pela Unilever) são marcas em forte crescimento que estruturaram seus negócios a partir de produtos orgânicos e processos de produção regenerativos, ou seja, que não só conservam, mas melhoram as condições dos recursos naturais. A Nestlé prepara-se para lançar uma linha de leites orgânicos no Brasil, que tem potencial significativo para gerar mudanças no mercado de lácteos brasileiro. A Natura usa a biodiversidade para a criação de produtos inovadores que valorizam a sua marca a partir dessa identidade única no mercado nacional e internacional.
A Schneider Electric desenvolve suas tecnologias com o objetivo de contribuir para a solução do dilema energético global – ampliar o uso de energia e ao mesmo tempo reduzir as emissões de carbono. Esses novos modelos de negócios se baseiam em vantagens competitivas que até agora eram ignoradas, mas que hoje podem ser parte de uma nova estratégia de fortalecimento da indústria brasileira. O Brasil possui a maior biodiversidade do planeta, além da maior reserva de água doce do mundo e a indústria tem a possibilidade de explorá-la de forma sustentável para produzir alimentos, medicamentos e novos materiais para o mercado mundial. Tem ainda uma das melhores insolações do mundo , além de um potencial de energia eólica maior que toda a demanda de energia do país . O que Carlota Perez chama de economia baseada em recursos naturais – não são commodities, são produtos únicos e de alto valor, baseados em tecnologias de ponta e produzidos de forma sustentável.
O Brasil é também um dos poucos países do mundo que combinam uma grande estrutura industrial e agrícola localizada próxima a um dos maiores mercados consumidores do mundo. Esta proximidade é uma condição que permite estruturar uma economia circular que além de reduzir impactos ambientais, reduz custos e gera novos negócios lucrativos.
Soma-se a isso um amplo capital social: uma sociedade democrática, diversa, empreendedora, com uma forte e ativa sociedade civil organizada, com a população mais conectada na América Latina.
Essas empresas estão descobrindo o potencial econômico de negócios orientados para a solução de problemas sociais e ambientais. Essas estratégias dependem de modernas tecnologias, mas dependem principalmente da capacidade de aplicá-las em um contexto muito complexo. Sem uma governança moderna isso não seria possível.
A inovação está nas pessoas e na forma como elas se organizam
A exploração das vantagens únicas que permitiriam o desenvolvimento de uma economia inovadora no Brasil não pode ser realizada apenas com o uso de tecnologias. Por que a inovação depende das pessoas, mais do que das tecnologias? Negócios são bem-sucedidos apenas se forem desenhados a partir do conhecimento profundo da realidade das pessoas que farão uso dos produtos e serviços, além do que, dependem de pessoas capazes de executar os negócios com alta competência. Essa é uma condição que depende de interações contínuas entre pessoas capazes de quebrar barreiras culturais e de conhecimento e adequar as tecnologias às condições sociais.
E a composição atual e a maneira como conduzimos a governança em nossas organizações endereça os novos desafios e oportunidades da sociedade e dos investidores de hoje e do futuro?
O Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC, reconhece a evolução do ambiente de negócios e da necessária ampliação do foco da governança. “Cada vez mais, desafios sociais e ambientais globais, regionais e locais fazem parte do contexto de atuação das organizações, afetando sua estratégia e cadeia de valor (…) Tais circunstâncias impõem a necessidade de uma visão ampliada do papel das organizações e do impacto delas na sociedade e no meio ambiente e vice-versa”.
Entretanto, na prática ainda muitos conselhos são engolidos por pressões de risco, compliance e de resultados de curto prazo, com uma dinâmica e engajamento distante do corpo diretivo, do negócio, da realidade da empresa, do mercado, do contexto do país e do mundo, sem expandir as fronteiras formais das reuniões, sem interação com outras organizações da sociedade e sem uma composição de fato com diversidade, seja ela de gênero, geracional, de experiências de carreira e de formas de pensar, que permita a revisitação de estratégias e construção de uma cultura de inovação com uma visão ampliada, incluindo mudanças mais profundas e que vão além das perspectivas da inovação tecnológica e digital.
A governança corporativa do século XXI deve ser capaz de promover a adaptação das empresas ao ritmo exponencial da capacidade cognitiva. A governança da era digital deve ser competente para tomar decisões empresariais estratégicas, utilizando os princípios que hoje orientam os processos de inovação, com agilidade, criatividade e experimentação, conhecendo a fundo a experiência do usuário e desenvolvendo uma capacidade de aprender com os erros, numa perspectiva em que todos ganhem.
Conversa
Thyago Rioshy
7 anos ago
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